A safra 2025/26 do milho começa a ser planejada por produtores brasileiros em um cenário marcado por desafios que podem impactar diretamente a rentabilidade da cultura. A combinação de custos elevados, oscilações cambiais e incertezas no mercado internacional tem preocupado especialistas e agricultores, especialmente nas regiões do Cerrado, Sul e Sudeste do país.
Segundo Anderson Galvão, Diretor da Célieres Consultoria, o Brasil importa cerca de 70% a 75% dos fertilizantes consumidos na agricultura, tornando a produção agrícola sensível às variações nos mercados externos. “O principal ponto de atenção é a volatilidade no preço e na oferta de fertilizantes nitrogenados, principalmente a ureia, que pode ser afetada pelo conflito entre Israel e Irã no Oriente Médio”, explica Galvão. No entanto, ele ressalta que o Brasil conta com diversos fornecedores globais, o que pode minimizar o impacto de eventuais interrupções no fornecimento de insumos iranianos.
Além do conflito, outro fator que pressiona os custos é a valorização do real frente ao dólar, que, apesar de beneficiar a compra de insumos importados, afeta negativamente os preços domésticos do milho, reduzindo a competitividade dos produtores. “Um aumento de 10 centavos na taxa de câmbio pode significar quase R$ 5,00 a menos no preço da saca de milho, e a valorização atual do real traz preocupação para os resultados financeiros do agricultor”, detalha Galvão.
Jeferson Souza, Analista de Fertilizantes da Agrinvest, reforça o alerta sobre a necessidade de um planejamento financeiro rigoroso para a próxima safra. “Diante da alta volatilidade dos preços dos fertilizantes e da pressão cambial, o produtor precisa travar custos e receitas em reais para garantir o equilíbrio do fluxo de caixa e proteger sua margem de lucro”, afirma Souza. Ele destaca que, especialmente para o milho safrinha — que representa grande parte da produção no Centro-Oeste — o impacto no custo de produção tem sido expressivo.
O presidente da Aprosoja Goiás, Clodoaldo Calegari, reforça esse cenário de custos crescentes e preços preocupantes: “Os custos da próxima safra são superiores aos custos dessa safra que acabamos de fechar. Tivemos um aumento bastante significativo nos fertilizantes, principalmente a partir da virada do ano, fevereiro em diante, e também subiu muito o preço de produtos à base de potássio e do fosfatado. Agora, recentemente, com esses conflitos, o nitrogenado puxado pela ureia também está se elevando. Estamos entrando em uma nova safra com custos acima da anterior e com a perspectiva de preços iguais ou até menores do que a safra que concluímos. Então, se não colhermos uma safra robusta, a coisa ficará muito séria.”
Por outro lado, um levantamento recente do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea) mostra uma leve redução no custo de produção do milho no Mato Grosso, maior estado produtor do país. De acordo com o relatório, o custeio do milho de alta tecnologia para a safra 2025/26 está estimado em R$ 3.216,06 por hectare, uma queda de 0,29% em relação ao levantamento anterior. “Essa retração é explicada principalmente pela redução nos custos das sementes, corretivos de solo e macronutrientes”, detalham os técnicos do Imea.
Apesar da redução no custeio operacional, o Custo Total (CT) teve leve alta, chegando a R$ 6.638,14 por hectare, impactado por custos de oportunidade da terra, capital circulante e máquinas, que subiram em função da elevação da Taxa Selic. Para cobrir o custo operacional efetivo (COE), considerando a produtividade média das últimas três safras de 116,7 sacas por hectare, o produtor precisa comercializar o milho a pelo menos R$ 40,33 a saca, valor próximo aos preços atuais em algumas regiões, mas que pode não garantir margens confortáveis diante das demais variáveis.
O cenário internacional também traz elementos que influenciam o mercado doméstico. O aumento do preço do petróleo, decorrente dos conflitos no Oriente Médio, tende a elevar os custos dos combustíveis no Brasil. Por outro lado, esse movimento pode favorecer a indústria de etanol, aumentando a demanda pelo milho como matéria-prima para biocombustíveis, um segmento que tem crescido nos últimos anos.
O analista da Royal Rural, Ronaldo Fernandes, acrescenta que a guerra no Oriente Médio gera uma grande indefinição para os custos da próxima safra, especialmente porque o Irã é responsável por quase 20% da ureia consumida no Brasil e Israel por insumos à base de fósforo.
“Muitas indústrias de fertilizantes já estão retirando produtos das listas de venda, aumentando a incerteza. Apesar dessa alta nos custos, o mercado só vai considerar isso se os produtores pararem de vender. Infelizmente, muitos acabam vindo ao mercado mesmo com margem negativa, pois precisam liberar caixa ou espaço”, explica.
Fernandes também destaca que, diante de um mercado diferente dos anos anteriores, com safra cheia e tensões geopolíticas e comerciais, o produtor está atrasado na comercialização e deve agir com cautela para não ficar exposto aos riscos que o cenário apresenta.
Apesar das dificuldades, tanto Galvão quanto Souza destacam que a demanda pelo milho permanece sólida. Internamente, o setor de proteína animal — incluindo avicultura, suinocultura e laticínios — segue com consumo em expansão, assim como o mercado de etanol de milho. Externamente, a exportação continua sendo um dos principais motores para absorver a produção nacional, com projeções acima de 47 milhões de toneladas para o ciclo 2025/26.
“Ainda que o avanço da colheita da segunda safra traga pressão para baixo nos preços no curto prazo, há expectativa de recuperação dos valores a partir do segundo semestre, sustentada por essa demanda robusta”, avalia Galvão.
O desafio para os produtores, portanto, será equilibrar os custos de produção com as condições de mercado, garantindo planejamento financeiro e aproveitando oportunidades para mitigar riscos em um ambiente ainda marcado por volatilidade cambial e geopolítica incerta.